A insônia pode ser definida como uma queixa persistente de dificuldade em iniciar ou manter o sono, ou de experimentar um sono não reparador. Seu impacto vai muito além de uma noite mal dormida: afeta humor, memória, concentração, saúde física e qualidade de vida. Ela pode ser classificada de acordo com a duração, sendo considerada aguda quando está relacionada a um evento estressante identificado, com duração inferior a três meses. Já a insônia crônica ocorre pelo menos três vezes por semana, durante mais de três meses, e tende a se tornar um problema persistente caso não seja tratada de forma adequada.
A compreensão correta do transtorno é fundamental, já que muitas pessoas acreditam que “dormir mal faz parte da rotina”, quando na verdade se trata de uma condição tratável e que tem alternativa terapêutica eficaz: a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC).
Prevalência da insônia no Brasil
De acordo com levantamentos realizados pela Fiocruz entre 2023 e 2024, cerca de 72% dos brasileiros relatam algum tipo de alteração no sono. A Associação Brasileira do Sono (ABS) estima que aproximadamente 73 milhões de brasileiros sofram com insônia — um dado que evidencia a dimensão do problema no país.
A insônia tende a ser mais prevalente em:
- mulheres,
- idosos,
- pessoas com transtornos de humor,
- indivíduos que vivem com ansiedade,
- pessoas com condições clínicas associadas, como dor crônica ou estresse prolongado.
A falta de tratamento adequado faz com que o problema se cronifique e gere prejuízos significativos no funcionamento diário.
Funções do sono
O sono é um estado biologicamente programado e essencial para a saúde física e emocional. Embora pareça um momento de “desligamento”, ele é extremamente ativo do ponto de vista cerebral, sendo fundamental para diversas funções:
- consolidação da memória
- recuperação física
- regulação emocional
- metabolismo adequado
- manutenção do sistema imunológico
Quando alguém dorme pouco por longos períodos, como ocorre em casos de insônia, o corpo entra em um estado de desequilíbrio. É importante reforçar que não é possível “recuperar o sono perdido” de forma simples com cochilos ou compensações no dia seguinte. A privação de sono recorrente altera hormônios, reduz energia, afeta o humor e prejudica as funções cognitivas.
Como a TCC pode ajudar nos casos de insônia
A Terapia Cognitivo-Comportamental para Insônia (TCC-I) é considerada o tratamento psicológico mais eficaz para esse problema, sendo amplamente recomendada por pesquisas e diretrizes internacionais. Segundo autores, a intervenção cognitivo-comportamental tem papel essencial para compreender e modificar padrões que mantêm o adoecimento decorrente da insônia.
A abordagem atua tanto nos fatores cognitivos (pensamentos) quanto nos comportamentais.
1. Alívio dos sintomas
Logo nas primeiras sessões, muitos pacientes relatam melhora na qualidade do sono. Isso ocorre porque a TCC-I promove mudanças na rotina, reduz comportamentos que mantêm a insônia e ensina técnicas de manejo fisiológico da ansiedade noturna.
2. Identificação e reversão das causas
A TCC ajuda o paciente a entender por que sua insônia se mantém. Entre os fatores mais comuns estão:
- crenças disfuncionais sobre o sono (“se eu não dormir 8h, não funciono”),
- preocupação excessiva ao deitar-se,
- associações negativas com o próprio quarto,
- comportamentos inadequados na rotina noturna,
- ciclos de ansiedade e frustração ao tentar dormir.
A partir dessa análise, o terapeuta trabalha estratégias específicas para quebrar esses ciclos.
3. Técnicas específicas baseadas em evidências
Como destacado pela literatura, a TCC-I utiliza técnicas cientificamente validadas, como:
- Higiene do sono: organização do ambiente e rotina.
- Restrição de sono: aproxima a quantidade de tempo na cama do tempo real de sono.
- Controle de estímulos: reconectar o quarto à sensação de sonolência.
- Intervenções cognitivas: questionamento de pensamentos negativos sobre o sono.
- Treinamento de relaxamento: respiração, relaxamento muscular, mindfulness.
- Essas intervenções são adaptadas de acordo com o caso e têm forte respaldo em evidências clínicas.
4. Efeito duradouro
Um dos grandes diferenciais da TCC é a promoção de resultados duradouros. O paciente aprende habilidades que continuam funcionando mesmo após o fim da terapia, reduzindo a probabilidade de recaídas.
Higiene do sono: o que é e por que funciona?
Criado por Peter Hauri, o conceito de higiene do sono se refere a um conjunto de práticas que promovem hábitos saudáveis de descanso. Ela não trata a insônia sozinha, mas é uma parte essencial da TCC-I, funcionando como base para mudanças mais profundas.
Entre as recomendações mais importantes estão:
- manter horários regulares para dormir e acordar;
- evitar telas e estímulos intensos antes de dormir;
- reduzir uso de cafeína, nicotina e álcool;
- manter o quarto escuro, silencioso e confortável;
- evitar cochilos prolongados durante o dia;
A higiene do sono cria condições ideais para que o corpo entre no estado de relaxamento necessário.
Conclusão
A insônia não deve ser tratada como “frescura” ou como uma consequência inevitável da rotina. Ela é um transtorno real, com impacto significativo na saúde física e emocional. A Terapia Cognitivo-Comportamental oferece ferramentas eficazes para compreender os motivos da insônia e superá-la de forma estruturada e duradoura.
Se você percebe dificuldade para iniciar o sono, despertar durante a noite ou acordar com a sensação de cansaço constante, buscar ajuda profissional pode ser o passo fundamental para recuperar sua qualidade de vida.
Referência:
SILVA, Natália Araújo; MELO, Hugo Christiano Soares. A intervenção da Terapia Cognitivo-Comportamental no adoecimento decorrente da insônia. Psicologia e Saúde em Debate, [s. l.], 2015